As nossas estrelas

pesquisar

 
Terça-feira, 11 / 08 / 15

Como preparar uma criança para a escola primária

Como preparar uma criança para a escola primária
 
Criança na paragem do autocarro
 
 

A entrada na escola primária é um momento importante na vida escolar de qualquer criança, que certamente sentirá um misto de ansiedade e excitação. Saiba como ajudar o seu filho a ultrapassar eventuais inseguranças e a preparar-se para um ano letivo – o primeiro! – repleto de sucesso.

Vais para a escola primária!

O final das férias é normalmente um período de alguma tensão, para pais e filhos, sobretudo quando as crianças vão entrar para a escola primária. O receio do desconhecido, bem como a separação dos pais, após um longo período de férias, pode contribuir para alguma insegurança por parte das crianças, bem como algumas expectativas por parte dos pais, que sentem uma espécie de abalo emocional, por deixarem os seus filhos num local completamente novo. Aqui ficam alguns conselhos que poderão reduzir o nível de stress, por parte das crianças, mas também dos próprios pais.

Criar uma imagem positiva da escola

É importante criar uma expectativa positiva em relação à entrada para a escola primária, o que pode ser feito de várias formas:

  • Falar da experiência pessoal dos pais, enquanto alunos na escola primária, contando aspetos que os marcaram e a importância que a escola teve para eles. A pequenada vai adorar ouvir histórias de quando os seus pais também eram pequenos alunos!
  • Fomentar o contacto das crianças com alunos que estejam neste  nível de escolaridade e que poderão falar de todas as aprendizagens e brincadeiras que viveram ao longo do ano letivo. Se houver irmãos mais velhos, devem proporcionar conversas animadas sobre a experiência na escola primária e aproveitar para mostrar fotos, trabalhos escolares, cadernos e manuais.

Levar a criança a conhecer a escola

É importante levar a criança a conhecer a escola primária que vai frequentar, com uma visita guiada a todas as suas valências: as salas de aula, o refeitório, a biblioteca, o pavilhão ou espaço desportivo, o recreio. Peça a um funcionário da escola para acompanhar essa visita e para explicar o tipo de atividades que habitualmente se realizam em cada um desses espaços. Desta forma, a criança aperceber-se-á que, para além da aprendizagem, a escola disponibiliza também equipamentos lúdicos, que poderão contribuir para muitas e divertidas brincadeiras com os outros alunos. Também aqui poderá aproveitar para pedir a um aluno da escola (alguém conhecido – como um primo, vizinho ou amigo – seria ótimo!) para os acompanhar nessa visita, pois, é sempre importante ouvir as experiências na voz de uma criança que já passou pelo primeiro dia de aulas na escola primária. Desta forma, estará a criar as condições necessárias para que a criança não se sinta tão “perdida” ou “desenquadrada” no início das aulas. Se possível, conhecer a professora antes do arranque do ano letivo será outra boa estratégia para preparar adequadamente a criança para a entrada na escola primária.

Fomentar o gosto pela leitura, pelo estudo e pela aprendizagem

Aproveite para ler ao seu filho, explicando-lhe que, em breve, será ele a ler para si. Fale-lhe do mundo fantástico das letras, que juntas se transformam em palavras e estas em frases. Leve a criança a bibliotecas ou livrarias, deixando-a descobrir o mundo mágico do livro. Faça da compra do material escolar uma verdadeira terapia de pais/filhos, mostrando-lhe todas as hipóteses de material que tem à sua disposição e deixando a criança escolher algumas coisas sozinha. Em casa, revejam o material e arrumem-no com carinho. Prepararem uma secretária de trabalho e deixe a criança começar a utilizá-la, falando-lhe dos trabalhos de casa, que aí realizará. Forre os manuais escolares, com a ajuda da criança, e arranje umas etiquetas bem divertidas para colarem juntos. Estes conselhos ajudarão a ultrapassar os receios iniciais do primeiro dia de aulas e contribuirão de forma significativa para o sucesso escolar da criança.

Criar novas e divertidas rotinas

Para que a criança não estranhe tanto as mudanças que se vão instituir com o início das aulas na escola primária, poderá optar por criar estas rotinas mais cedo, de forma divertida e com alguma criatividade, manifestando o seu entusiasmo perante uma nova e importante etapa na vida do seu filho. Desta forma, a criança sentir-se-á mais segura, pois já experienciou algumas dessas mudanças. Para isso, deverá:

  • Estabelecer os horários de deitar, acordar e de fazer os trabalhos de casa.
  • Fazer as refeições à hora estipulada, aproveitando este período de partilha para falar da escola, dos novos amigos que a criança vai criar, bem como das aprendizagens que vai fazer.
  • Brincar à escola com a criança, mostrando os novos manuais e aproveitando alguns dos temas de que gosta, para lhe despertar o gosto e entusiasmo pelas diferentes disciplinas.
  • Deixar sempre todo o material escolar e roupa para o dia seguinte preparado na noite anterior, de forma a evitar manhãs stressantes.
 http://pequenada.com/artigos/como-preparar-crianca-para-escola-primaria
publicado por salinhadossonhos às 11:30
Terça-feira, 21 / 04 / 15

Alfabetização precoce é perda de tempo

Para acontecer com sucesso, a alfabetização deve esperar que etapas anteriores estejam muito bem construídas e assimiladas.

Passamos tanto tempo recebendo e transmitindo informações por meio da linguagem escrita que ela nos parece quase tão espontânea quanto a comunicação oral. No entanto, não há nada de natural na leitura. Não existe no cérebro nenhuma sequer região especialmente dedicada à decodificação de símbolos que representem palavras. Trata-se de uma habilidade tão complexa que o cérebro precisa se adaptar a ela, criando um circuito neural que envolve diversas áreas - visual, auditiva e de linguagem.

A maioria de nós esqueceu como foi lento e trabalhoso o processo de aquisição da capacidade de leitura. O fato é que essa transformação no cérebro não acontece e nem pode acontecer de uma hora para outra. É um trabalho em etapas que, por ansiedade dos pais e como consequência inesperada da incorporação do antigo pré ao sistema básico de ensino, em 2004, vem sendo antecipado por muitas instituições de ensino no Brasil.

Não seria lógico concluir que, por se tratar de algo complexo, a linguagem escrita deveria começar a ser ensinada o quanto antes? Sim e não: se considerarmos que o contato com os livros, as brincadeiras de consciência fonológica, as histórias e as rimas recitadas e cantadas estão formando conexões no cérebro que serão importantes para a aquisição da capacidade de ler, esse processo deve sim começar cedo. Já a alfabetização propriamente dita, para acontecer com sucesso, deve esperar que etapas anteriores estejam muito bem construídas e assimiladas. No entanto, grande parte as escolas e muitos pais esperam que as crianças cheguem ao segundo ano sabendo ler e escrever. Neste nível, a maioria dos alunos tem entre cinco e seis anos de idade - fase em que não estão neurologicamente prontos para começar a ler. Algumas áreas do cérebro envolvidas na leitura, como o giro angular, não estão suficientemente desenvolvidas para que a decodificação faça algum sentido.

Muitas crianças memorizam letras ou mesmo sílabas, reproduzem palavras inteiras e escrevem seu nome por volta dos quatro anos de idade - o que não significa que isso tudo esteja sendo compreendido por elas. Na verdade, nessa idade elas têm uma memória excelente, mas geralmente não estão maduras para entender a linguagem escrita.

Estudos mostram que essa maturidade geralmente ocorre entre seis de sete anos, quando acontece o que o neurocientista cognitivo Stanislas Dehaene chama de "revolução mental" em seu livro Os Neurônios da Leitura (Penso Editora). É quando a criança começa a perceber que a palavra pode ser quebrada em diferentes fonemas. No entanto, nenhum cérebro é igual ao outro e sempre haverá variações na facilidade com que cada um se familiariza com a linguagem escrita, o que traz à escola o desafio de conhecer e respeitar o ritmo dos alunos.

Antes de estabelecer a chamada consciência fonológica, portanto, forçar a alfabetização é perda de tempo. Um tempo que pode ser muito bem aproveitado, pois crianças em idade pré-escolar estão em pleno desenvolvimento de sua consciência metalinguística e ampliando diariamente seu vocabulário. Estudos mostram que, aos três anos de idade, elas ganham a capacidade de absorver a quantidade impressionante de até 20 palavras novas por dia, enquanto assimilam naturalmente complexas regras gramaticais.

Em vez de forçar um cérebro ainda imaturo a relacionar letras a sons, poderiam estar exercitando a linguagem oral e suas habilidades metalinguísticas e, assim, familiarizando-se com a complexidade das construções sintáticas que seu idioma oferece. Muito mais importante que começar cedo é relacionar a leitura a algo agradável e prazeroso e não a um desafio penoso. Para isso, é necessário que pais e educadores respeitem o ritmo e a maturidade de criança para então iniciar a alfabetização.

http://www.brasilpost.com.br/michele-muller/alfabetizacao-precoce-e-p_b_7019166.html

publicado por salinhadossonhos às 19:33
Terça-feira, 07 / 04 / 15

Há escolas...

556045_554915247866354_2110033897_n.jpg

Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo.
Pássaros engaiolados são pássaros sob controle.
Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser.
Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros.
...Porque a essência dos pássaros é o voo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados.
O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros.
O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

Rubem Alves
tags: ,
publicado por salinhadossonhos às 07:44
Terça-feira, 24 / 03 / 15

Tudo é eterno

Escrito por Eduardo Sá Sexta, 11 Abril 2014 

Muitos professores são, muitas vezes, tios e, mesmo não devendo, são um bocadinho pais.

A escola é uma sala de estar, tem de aconchegar! Um professor de verdade educa antes de ensinar e é por isso que muitos professores são, muitas vezes, tios e, mesmo não devendo, são um bocadinho pais.

  1. Na verdade, nada é tão linear como parece. Nem as crianças são pequenas, nem os seus pais crescidos, como aparentam. Elas nem sempre crescem. E eles voltam, por entro, muitas vezes, para trás. Com o tempo há quem se torne jovem. E quem, entre as oportunidades que tem para crescer, vacile e envelheça. Com o tempo, há quem se torne ingénuo e sábio, arrebatado, amável, terno ou buliçoso. E quem azede, adoçando a ira de euforia. Com o tempo há quem - de cada vez que muda queira começar do zero (como quem deixa de si quase tudo para trás). E há quem recrie tudo o que sabe, nunca partindo sem que leve aquilo que os outros teimam em deixar. Para quem envelhece nada é eterno. Para quem se recria tudo é para sempre. Quem envelhece morre todos os dias, um pouco mais. Quem se recria torna-se jovem, sempre que aprende.
  1. Na verdade, nada é tão linear como parece. E é por isso que eu imagino que, um dia, a escola deixe as linhas direitas e se desarrume um bocadinho. E mais pareça uma praça muito grande, onde, a par de todas as matérias que as crianças tenham de aprender, haja um senhor, com bigodes retorcidos e rosetas afogueadas, tomando conta do sorriso, que as torne brincadoras. E lhes explique - devagarinho, se for preciso – que brincar é aprender. As crianças deviam ter recreios de compensação até que aprendessem a brincar. E ninguém as devia largar enquanto não abafassem berlindes, jogassem ao lenço ou à macaca, porque primeiro liga-se o corpo e aquilo que se sente e, só depois, o que se sabe com tudo o que se aprende. É por isso, certamente, que, ao contrário dos sabichões, os sábios nunca são enfadonhos. E um dia, para além da história que vem nos compêndios que cheiram bem, a D. Perpétua, que distribui graçolas com os jornais que vende, todos os dias, devia ensinar às crianças que, tão importante como a conjugação dos verbos e a gramática, a aritmética ou a matemática, é bom chorar no cinema, quando tem de ser. E só se aprende uma história, seja a de um rei ou a de um peixe com memória de grilo, por exemplo quando ela entra por nós sem nenhum «se faz favor!?...» e fi ca, em parte incerta, cavaqueando baixinho. E que o senhor do talho, que empurra o mundo com o avental, avalie com todo o rigor se cada criança é capaz de rir até às lágrimas, antes de ousar pegar no lápis e escrever aquilo que se acotovela na imaginação. Na verdade, o riso é amigo do espanto. E quem não se espanta nunca aprende que um problema é sempre muito mais importante do que qualquer solução. Ah! E se houver um Doutor Valeroso, de óculos descaídos, que não ensine o português antes de as crianças aprenderem a ir ao último capítulo, logo depois de passarem pela casa da partida, será demais. Como é bom atropelar a imaginação sempre que se adivinha! Sem nunca, mesmo nunca, confundir sonho e devaneio! A escola é uma sala de estar. Tem de aconchegar! E precisa de explicar, ao mesmo tempo, que compreender não é condescender. E que um professor de verdade educa antes de ensinar e é por isso que muitos professores são, muitas vezes, tios e, mesmo não devendo, são um bocadinho pais. A escola devia ser, também, um banco de jardim. E devia pôr, no lugar da unicidade, a pluralidade: diversos professores, muitos amigos, os pais num entra e sai, mais a D. Perpétua, o senhor das rosetas e o homem do talho que educam melhor, e põem mais longe no olhar. A escola devia ter um cantinho, para cada um. E um diretor de turma devia dar poucas aulas. Muito poucas. E devia telefonar, a perguntar pela constipação da Constança e devia fechar a escola, sempre que uma criança se zangasse com ela e a abandonasse. E sempre que uma criança reprovasse duas vezes, devia considera-la em perigo. Não tanto a criança, mas a escola e a família (que parecem distraídas, uma com a outra, e não a conhecem).
  1. A escola é uma praça, uma sala de estar e um banco de jardim. E, com o tempo, devia tornar ingénuos e sábios, arrebatados, amáveis, ternos ou buliçosos todos aqueles que vacilam e envelhecem. Para quem envelhece nada é eterno. Para quem aprende tudo é para sempre.. A escola devia ter um cantinho, para cada um. O diretor de turma devia fechar a escola, sempre que uma criança se zangasse com ela e a abandonasse.

 

Crónica da edição de março de 2009.

http://www.paisefilhos.pt/index.php/opiniao/eduardo-sa/7034-tudo-e-eterno

publicado por salinhadossonhos às 17:27
Terça-feira, 10 / 02 / 15

Falta muito p’ra chegar?...

Escrito por Eduardo Sá Quinta, 16 Outubro 2014

 A escola faz mal às crianças quando permite que os jardins de infância sejam pré-escola. Crónica de Eduardo Sá.

alt

 

A escola faz mal às crianças... se ela for uma “linha de montagem” de “produtos normalizados”; à margem da imaginação, da criatividade e, sobretudo, da singularidade.

A escola faz mal às crianças quando se chama a um berçário uma... escolinha e se imagina que a “vida escolar” comece aí. E se permite (sem nada se fazer para o alterar) que, desde muito cedo, haja crianças confiadas a berçários. Por causa dos técnicos que lá estão? De modo algum! Porque as crianças são obrigadas a ter ritmos e rotinas muito pouco personalizados. Se ligar a biologia nervosa, as incidências da sua história de vida e os ritmos dos pais já não é fácil, imaginando que eles sejam capazes de se descentrar de si próprios, ligar tudo isto com uma uniformidade dos ritmos da maioria dos berçários (com tempos idênticos para as crianças se alimentarem, para dormirem ou para serem estimulados) faz mal aos bebés. Num país amigo das crianças, e considerando o bem precioso que representam, só se devia entrar numa... escolinha dos dois para os três anos. Até lá, seja a mãe ou o pai − com possibilidade de terem licenças de parentalidade mais alargadas ou trabalho em tempo parcial − sejam os avós (mesmo que, para tanto, sejam apoiados pela segurança social), seja uma ama (de preferência, em casa dos pais), tudo é melhor para a saúde do bebé. Passar dias e dias deitado, olhando para o ar − na verdade, olhando para o mesmo mobile que dá voltas e voltas diante do seu nariz − torna cada bebé um bocadinho mais estúpido do que quando lá entrou.

A escola faz mal às crianças quando permite que se distinga, todos os dias, a educação infantil do ensino obrigatório, e se permite que os jardins de infância não sejam, tendencialmemte, gratuitos e para todos os meninos. Mas faz, ainda, pior quando permite que haja infantários da rede pública, que funcionem, há anos a fio, em contentores, e infantários, muito exclusivos, onde estão oito, dez ou 12 crianças, no total, e onde os pais, privando-os do bem precioso da vida (na sua generosidade inclusiva), pagam 1500, 2000 e 2500€ por mês por uma exclusividade que debilita o crescimento e as crianças.

A escola faz mal às crianças quando permite que os jardins de infância sejam pré-escola. É por isso que eu acho que devia ser proibido ensinar a ler e a escrever no jardim de infância! Mas, então, para que é que serve um jardim de infância? Serve para as crianças se socializarem. E serve para alimentarem a surpresa de transformar uma educadora numa... quase-mãe.

Serve para alimentar a educação física como se fosse uma escadinha: indo da tonicidade ao equilíbrio, e daí ao movimento, à coordenação motora, ao ritmo, à expressividade, ao brincar, ao jogo e, naturalmente, à relação. Tudo isso ajuda a perceber que todos os meninos ensinados a domesticar o corpo não sabem pensar e vivem fugindo... da vida.

O jardim de infância serve, também − tenho-o dito − para a educação visual. Ajuda a distinguir olhar e ver; ajuda a ir do garatujo ao rabisco e do rabisco ao traço; ajuda a ir do corpo (com que se desenha e com que se pinta) ao pensamento (e vice-versa); ajuda a ir do sentir ao representar; e ajuda a criar imagens e símbolos (para que sejam desconstruídos, a seguir). O jardim de infância ajuda a perceber que quem não sabe desenhar não sabe escrever!

O jardim de infância serve, também, para a educação musical. Para ir do som à harmonia dos sons e, com isso, para ir da sensibilidade à expressão musical e dela aos sons com forma (que são as letras) e aos sons com legendas que são as palavras. A música é a única Torre de Babel do mundo: sem a música as crianças tornam-se menos aptas para a língua materna. E sem língua materna, versátil e expressiva, nunca organizam um ritmo do género “sente, discorre e faz” sem o qual o pensamento deixa de pensar sobre si e sobre o mundo. E adoece!

O jardim de infância serve para brincar. Porque quem não brinca fica fechado (e desconfiado) no seu mundo e, em vez de ficar amigo da diferença (sem a qual nunca se cresce) fica xenófobo e arrogante, mais agarrado ao passado do que amigo do futuro.

O jardim de infância serve para escutar histórias e para as reproduzir; e para as reconstruir; e para as dramatizar; e para fazer com que elas ganhem vida em nós e, assim, servem para ir do drama à sátira ou à comédia mas, sobretudo, servem para ir da intriga à surpresa, à empatia, à comunhão e ao entusiasmo.

O jardim de infância serve, ainda, para conversar. É por isso que as crianças − todas as crianças (!) − para serem saudáveis, têm de ser ruidosas na sala de aula e têm, de fazer uma algazarra, no recreio. E têm de chocar umas com as outras, têm de se sujar, e de transpirar, com abundância. Escolas com poucos recreios ou com maus recreios são escolas com necessidades educativas especiais e são escolas amigas do insucesso escolar!!! Do mesmo modo, todas as escolas, seja qual for o grau de ensino, que não tenham um quadro de honra para os alunos faladores, não são uma escola: são um lugar onde se transformam crianças saudáveis em pessoas sonsas e insossas.

Estamos a passar, como reparam, do jardim de infância ao ensino básico... Mas se é básico é porque com ele se aprofundam as bases do conhecimento. Então, se olharmos com atenção, temos razão para dizer que...

A escola faz mal às crianças quando as deixa ter aulas ou de manhã ou de tarde. Todos somos mais inteligentes de manhã. Porque somos animais sensíveis à luz... É por isso que as aulas de tarde incentivam o insucesso escolar. E faz mal quando se deixa que o dia escolar comece com a educação física, por exemplo, e termine, já com os crianças fisicamente cansadas, com o português. Isto é: uma parte da distração dos alunos resulta da forma, muitas vezes sem sentido, como se organiza um dia de aulas.

A escola faz mal às crianças quando elas estão tempo de mais na escola, com aulas expositivas que nunca mais acabam, e com recreios “supersónicos” de dez minutos. Mais tempo de escola tem-se traduzido em melhores resultados escolares? Não!!! Veja-se, por exemplo, os mais diversos exames nacionais. Mas, então, são os alunos que não prestam, são os professores que os atropelam, são os pais que os infernizam ou é o sistema que ignora a sua sabedoria, que insiste em não perceber como eles pensam e insiste em premiar, unicamente, aqueles que reproduzem e que repetem (isto é, os “macacos de imitação”)? Menos escola será pior escola? Não! Eu não acho que as crianças não devam trabalhar! Acho, isso sim, que brincar rima com aprender e não é por se trabalhar mais horas que se aprende melhor. Aliás: acho que estamos a pôr todas as “fichas” do crescimento das crianças na escola, dando-lhe mais importância do que ela merece: a família é mais importante que a escola e brincar é tão importante como aprender. Escola e mais escola, sem família e sem brincar, é imaginar um crescimento onde a escola não dá vida mas dá, antes... “vistos gold” (com as consequências que todos conhecemos noutras áreas...). Atenção: estamos a transformar as crianças em burocratas de mochila; e isso é mau! Porque as tomamos como se, com isso, elas não fossem capazes de compatibilizar a vida familiar com o trabalho, a vida social com o desporto e com os amigos, os seus amores, com os sonhos e com o futuro. Ora, se elas não têm uma vida plural nos seus desafios, estamos a criar crianças... frágeis! Dar demasiada importância à escola é imaginar que a vida só se aprende nos livros, e que a “escola da vida” (que acarinha os erros e os enganos) não é a fonte de sabedoria que, de facto, ela é! Mais ainda: é esquecer que os avós sabem sempre mais que os livros; que os pais nunca têm todas as soluções mas encontram respostas únicas e engenhosas; que os professores se tornam desafiantes não tanto quando fornecem as soluções mas sempre que, de olhar matreiro, põem problemas; e que os amigos e os recreios são, eles próprios... uma “escola”! Escola são os avós, os pais, os professores, os amigos, os livros, as aulas e a vida todos misturados e todos diferentes.

Mas a escola faz mal às crianças quando imagina que elas tenham de fazer parte dum mesmo grupo de meninos entre o jardim de infância e o 9º ano de escolaridade, pelo menos. Ao contrário disso, eu acho que as crianças não são de porcelana: ao fim de um ano letivo, cada grupo deve baralhar-se, dividir-se em quatro e “voltar-se a dar”, com outro professor (ou, de preferência, com outro par educativo). Um sistema educativo assustado com a mudança não é amigo da escola nem da vida: transforma meninos saudáveis em crianças “imunodeprimidas”: intolerantes à frustração, desconfiadas diante da diferença e debilitadas diante do amor pela vida.

A escola faz mal às crianças quando as poupa à crítica e não as corrige, ao mesmo tempo que as escuta. Mas porque é que dizer a uma criança que fez mal se tornou um pecado? Ou que se enganou ou que pode ser melhor, que pode ser mais afoita, mais acutilante, mais educada ou mais arrojada? Mas quem é que inventou que isso as traumatiza?... O traumatismo são ressentimentos que se guardam; nunca dores que se partilham! Ainda assim, a escola faz mal quando só as reprova a elas, sempre que as crianças têm desempenhos negativos. E quando não questiona os pais e os professores que necessitam de planos educativos individuais; as escolas com défices de atenção, onde elas estão; as direções de escola hiperativas (com as quais têm de conviver todos os dias); e um ministério com (muitíssimas!) necessidades educativas especiais mas que, contra todas as evidências, tem de si a ideia dum sobredotado.

A escola faz mal quando distingue ensino regular e ensino especial, imaginando que umas são crianças de primeira e as outras têm necessidades educativas especiais. Todas as crianças têm sempre uma ou outra necessidade educativa especial e, todas elas, ganhavam se tivessem planos educativos individuais!! Mesmo as crianças certinhas? Sobretudo essas, tão queridas da escola. Na verdade, são certinhas porque são tristonhas. Já não falando das crianças exemplares que só o são porque têm pais autoritários, hostis ou, até, tirânicos. Fazer, no entanto, da educação especial uma espécie de enclave dedicado a crianças, supostamente, “atrasadas mentais” é que não! Em vez de tornar a escola inclusiva, exclui, etiqueta e descrimina!

A escola faz mal às crianças quando se preocupa a identificar autismos, dislexias, défices de atenção, síndromes de Asperger ou hiperatividades em vez de perguntar porquê! Por que é que uma sociedade que diz de si própria ser amiga do conhecimento faz com que, mal chegam às aulas, permite que as crianças, os pais e a escola, ela própria, deixem de perguntar: “porquê?... Porque é que mal as crianças têm um insucesso há sempre dois “porquês oficiais”: ou os pais discutem e estão a divorciar-se ou elas têm um defeito de fabrico?.... Então, e o modo como a escola está organizada, não é importante? E a forma como um professor (ou outro) estão de “candeias às avessas” com o ensino, não interfere na aprendizagem? Não é batota supor que os alunos, que lidam com a linguagem matemática de forma excelente (quando jogam num computador, por exemplo) sempre que têm insucesso na matemática, a culpa seja sua e de mais ninguém, nunca se questionando os professores de matemática, os professores que formam os professores de matemática, ou os programas de matemática, a didática e a pedagogia com que se fala de matemática? Uma escola pouco amiga dos porquês não é uma escola: é (desculpem!) uma tecnocracia amiga da estupidez, que pega nas crianças e as transforma em jovens tecnocratas de fraldas; depois, em jovens tecnocratas de mochila; mais tarde, em jovens tecnocratas que, à falta de mundo, se exibem no Facebook; para que, transformando alguns deles em jotas, passados uns anos tenhamos uma classe política que, muitas vezes, compensa com “equivalências”... a falta dum ofício, a falta de sabedoria e a falta de vida que foi tendo.

A escola faz mal às crianças quando permite que algumas escolas privadas sejam batoteiras!! E por mais cristãs que sejam escolham os alunos, à entrada. E sempre que um aluno tem dificuldades o convidem a sair. E logo que ele enviese os rankings o reprovem, para que as médias não se... constipem.

A escola faz mal às crianças quando permite, sem nunca perguntar porquê, que exista uma “epidemia atípica” de explicações. E faz mal quando utiliza a caderneta do aluno para se fazerem queixinhas e se repreenderem os pais. Ou, pior, para que depois de se desculparem do número excessivo de alunos por turma, existirem professores que acabam a passar trabalhos de casa para os pais! Ou, contra a sua vontade e traíndo a sua sensatez, acabam a passar trabalhos de casa em versão XL, simplesmente.

E faz mal, ainda, quando permite que muitos professores de escolas privadas vivam a escola sob coação. E sejam repreendidos quando são justos nas avaliações. E tenham de pôr pó de arroz nas notas porque há um colégio, ali ao lado, onde todas as crianças são, supostamente, sobredotadas. E tenham de as sinalizar, em fevereiro, para o ensino especial, para que não corram o risco de ser repreendidos, pelos seus diretores, se elas tiverem um nível ou outro abaixo da expectativa dos pais, em abril ou em maio. E fazem, ainda, mal sempre que algumas dessas escolas só aceitam ou rapazes ou raparigas, unicamente para que as crianças não se distraiam... (Não se estará, com isso, a sexualizar a vida para além do razoável?...) E outras que não ensinem o português ou a história de Portugal, mesmo que funcionem em Lisboa ou no Porto, porque são internacionais. Mas, afinal, quem pratica mais bullying na escola: os alunos, entre si, ou, sobretudo, quem a devia dirigir e quem se abstém de a regulamentar?

Talvez tenhamos, hoje, as melhores famílias que a humanidade jamais criou, as escolas mais plurais e mais atentas, e a mais fabulosa enciclopédia do mundo (que é a internet)! Mas, por nossa omissão, receio que estejamos a fazer mal ao crescimento das crianças, dos adolescentes e dos jovens. Porque eles foram poupados, felizmente, a condições de vida muito difíceis e foram poupados à morte e ao sofrimento banais. Mas, por isso, é urgente que elas desenvolvam, também, competências para o insucesso.

Para que serve, afinal, a escola? Para dar conhecimento? Não! Para aprender a procurá-lo!! E para acarinhar o erro!!!!!!!!! Serve para informar? Não! Serve deixar que a crianças a recrie e se recreiam com ela; porque quem não recria e não recreia nunca aprende! Serve para perguntar: “Professor, posso pôr uma pergunta?” Não! Porque, ao contrário do que muitos acham, o contraditório não é (nunca é) um delito de opinião. Mas é, simplesmente, o melhor amigo da dúvida com que se rasga mais uma avenida nova no conhecimento!

A escola serve para sentir e para imaginar. Serve para abstrair e sintetizar. Serve para discorrer e para pensar. Serve para educar para a humanidade. E serve, também, para acarinhar os afoitos, os arrojados, os desafiantes, os atrapalhados, os engasgados e os insubmissos. Serve para distinguir os sabidos, dos sabichões e dos sábios. Serve para fazer com que as crianças não sejam nem simplistas nem simplórias mas que percebam que a simplicidade é sempre (e só) uma consequência da sabedoria. A escola serve, finalmente, para preservar as qualidades com as quais as crianças lá chegam: serve para as manter tagarelas, serve para as proibir de brincar com iPads, enquanto elas não descobrirem os intestinos das coisas e enquanto não se sujarem. Serve para manterem a cabeça no ar (enquanto põem os pés na terra). Serve para usarem o nervoso miudinho com que alimenta o bicho carpinteiro com que se experimenta sempre que se aprende. E serve para perguntar porquê.

A escola serve para nos pôr problemas: nunca para os resolver. E é aqui que eu acho que passamos o tempo a dizer aos nossos filhos que a vida é fácil e, mais tarde ou mais cedo, eles sentem que foram enganados. As escolhas fáceis são o caminho mais curto para ficarmos burros mais depressa! Porque a vida é resolver problemas e, de complexidade em complexidade, à medida que os transformamos em sabedoria, nos tornarmos mais simples.

 

A escola é uma fábrica de sonhos. Mas serve, sobretudo, para não aceitarmos o sonho como um papel de parede. O sonho é, antes de tudo, uma janela que se insinua onde, antes, estaria, unicamente, uma parede. Peço, por isso, a todos os educadores e a todos os professores − porque talvez tenham a profissão mais próxima que existe da magia − que derrubem paredes, que tracem janelas mas (mesmo que vos desconsiderem, muitas vezes) peço-vos que sonhem! Porque é, sobretudo, com os vossos sonhos que um pouco mais de luz chega, todos os dias, a todas as crianças! E é com eles que todas elas ligam desassossego e confiança e, no seu faustoso fervilhar, ao mesmo tempo que pulam e avançam, vos perguntam uma e outra, e mais outra vez: falta muito p’ra chegar?...

http://www.paisefilhos.pt/index.php/opiniao/eduardo-sa/7442-falta-muito-pra-chegar

publicado por salinhadossonhos às 17:32

mais sobre mim

giseladias

O nosso colégio

DSCN5408.JPG

O nosso parque

DSCN5403.JPG

Valores

16745723_McsQ4

Agosto 2015

D
S
T
Q
Q
S
S
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

últ. recentes

  • É certo, já partiu...as carruagens separam-se!!!No...
  • A dupla imbatível!!!!! Bem hajam!!!!! :)
  • O bolo estava delicioso!!!! Obrigado... :)
  • Este mês, a televisão pública tem dado uma boa aju...
  • De nada, é essa a nossa missão: fazer crianças fel...
  • Obrigada aos meninos, à Anabela e Ercilia por comp...
  • As crianças conseguem sempre proporcionar bons mom...
  • Nada como a expontaniedade das crianças para nos f...
  • Obrigado! Foi um ano fantástico, cheio de coisas b...
  • Uma dupla imbatível! Nunca é demais referir o fant...

subscrever feeds

blogs SAPO


Universidade de Aveiro